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Por 6 votos a 5, STF muda de posição e derruba prisão após condenação na 2ª instância
POLITICA
Publicado em 08/11/2019

Por 6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (7) derrubar a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância, alterando um entendimento adotado desde 2016.

Como votou cada ministro

Na quinta sessão de julgamento sobre o assunto, a maioria dos ministros entendeu que, segundo a Constituição, ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado (fase em que não cabe mais recurso) e que a execução provisória da pena fere o princípio da presunção de inocência.

O voto de desempate foi dado pelo presidente do tribunal, ministro Dias Toffoli, o último a se manifestar.

A aplicação da decisão não é automática para os processos nas demais instâncias do Judiciário. Caberá a cada juiz analisar, caso a caso, a situação processual dos presos que poderão ser beneficiados com a soltura. Se houver entendimento de que o preso é perigoso, por exemplo, ele pode ter a prisão preventiva decretada.

A decisão pode beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso em Curitiba e cuja sentença ainda não transitou em julgado, além de cerca de 5 mil presos, se não estiverem detidos preventivamente por outro motivo.

Após o julgamento, a defesa de Lula informou que levará à Justiça nesta sexta-feira um pedido de soltura com base no resultado do julgamento do STF.

Lava Jato diz que decisão impactará resultados da força-tarefa

Toffoli e Fachin dizem que não haverá liberação automática de presos

  

COMO VOTARAM OS MINISTROS

A FAVOR DA 2ª INSTÂNCIA CONTRA A 2ª INSTÂNCIA
Alexandre de Moraes Marco Aurélio Mello
Edson Fachin Rosa Weber
Luís Roberto Barroso Ricardo Lewandowski
Luiz Fux Gilmar Mendes
Cármen Lúcia Celso de Mello
  Dias Toffoli

 

Sem liberação 'automática'

Decisão do STF não significa liberação automática de condenados sem o trânsito em julgado

Encerrado o julgamento, o presidente do STF, Dias Toffoli, disse que o Congresso pode alterar o artigo 283 do Código de Processo Penal para determinar em que momento haverá a prisão em caso de condenação.

O ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no STF, disse que não haverá "liberação automática" de presos em segunda instância. Ele afirmou ainda que "de modo algum" haverá prejuízos no combate à corrupção.

"Do ponto de vista do combate à corrupção, lavagem de dinheiro, deixamos de ter um mecanismo relevante, em meu modo de ver, constitucional. Mas isso não significa que todos os esforços para que haja o devido combate, nos termos da Constituição, deixarão de ser feitos", acrescentou Fachin.

 

A decisão

Com a decisão, ninguém poderá ser preso para começar a cumprir pena até o julgamento de todos os recursos possíveis em processos criminais, incluindo, quando cabível, tribunais superiores (Superior Tribunal de Justiça, STJ, e STF). Antes disso, somente se a prisão for preventiva.

A decisão tem efeito “erga omnes”, ou seja, vale para todas as instâncias do Judiciário e será vinculante – de cumprimento obrigatório.

Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cerca de 5 mil presos podem ser beneficiados pela mudança de entendimento, se não estiverem presos preventivamente por outro motivo. Levantamento do Ministério Público Federal a decisão do STF pode beneficiar 38 condenados na Operação Lava Jato.

O ex-presidente Lula pode obter liberdade, já que ainda cabem recursos da condenação dele no caso do triplex em Guarujá (SP). Essa decisão caberá à Justiça Federal do Paraná. Nos casos do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, entretanto, a mudança de entendimento do STF não os tira da cadeia.

No julgamento, os ministros apreciaram três ações declaratórias de constitucionalidade, apresentadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelos partidos PCdoB e Patriota.

Desde 2016, a Corte autorizou a prisão após segunda instância quatro vezes, mas a análise de mérito das ações permanecia em aberto. Por isso, juízes e até ministros do STF vinham decidindo de forma divergente sobre essas prisões. Agora, será obrigatório seguir o entendimento do Supremo.

 

Posicionamentos de AGU e PGR

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (AGU)

O advogado-geral da União, André Luiz de Almeida Mendonça, afirmou que o estado deve garantir direitos violados das vítimas. O ministro defendeu que os princípios da Constituição garantem o justo processo e, não à toa, a presunção da inocência e a prisão estão em momentos diferentes no texto constitucional.

“Interpretar a Constituição é concretizá-la. Porque ela tem que ser aplicada na vida em sociedade”, afirmou. “Toda a Europa trata nesse sentido, de separar presunção de inocência de prisão. Essa é a jurisprudência de direitos humanos.”

Mendonça disse ainda que o direito individual não é o direito do mais forte e não se dirige apenas ao estado. “Quem defende o direito individual das vítimas? Quem defende o direito de ir e vir das vítimas? O direito à vida das vítimas? O direito de ela sair do trabalho e ir com segurança em um transporte público? Saber que seu filho foi com segurança para a escola? Eu vi várias defesas de direitos individuais. Não vi defesa do direito das vítimas”, completou.

 

PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA (PGR)

O procurador-geral da República, Augusto Aras, argumentou que a prisão após a condenação por colegiado somente deixou de ser aplicada entre 2009 e 2016. E que somente os que têm mais recursos conseguem ter acesso às instâncias superiores.

Aras afirmou que, “em tempos de polarização”, é preciso uma solução que favoreça uma integração social e a unidade política.

“Ao nos afastarmos de um eventual raciocínio maniqueísta, o réu tem algo necessariamente acrescido em sua condição após sua sentença condenatória”, disse.

Segundo o procurador-geral, as instâncias extraordinárias, como o Superior Tribunal de Justiça, estão voltadas ao julgamento de teses e não de casos, “acessíveis apenas a alguns que dispõem de maiores recursos e mais bem situados pela fortuna que sua sorte lhes atribui”.

 

ENTIDADES

Antes, representantes de duas entidades apresentaram as duas últimas manifestações contrárias à prisão em segunda instância. Miguel Pereira Neto, do Instituto dos Advogados de São Paulo, disse que a presunção de inocência é garantia de todo cidadão e o Supremo não pode colocar isso em risco. “A garantia da presunção de inocência é garantia maior da pessoa humana”, disse.

O advogado Técio Lins e Silva, do Instituto dos Advogados do Brasil, disse que a prisão após o trânsito em julgado é regra prevista na Constituição. "Esta ação não interessa a meia dúzia de ricos, acabar com a Lava Jato, tornar impune a corrupção", complementou.

 

Entenda o julgamento

O plenário analisou um tipo de ação cujo efeito é chamado "erga omnes". Ou seja, a decisão valerá para todas as instâncias do Judiciário e será vinculante, de cumprimento obrigatório.

Os ministros julgaram três ações declaratórias de constitucionalidade, apresentadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pelo PCdoB e pelo Patriota.

Quando o STF iniciou a análise sobre o tema, o presidente do STF, Dias Toffoli, afirmou que as ações e o julgamento "não se referem a nenhuma situação particular".

Em 2016, a Corte permitiu a prisão de condenados em segunda instância, alterando um entendimento que vinha sendo seguido desde 2009, segundo o qual só cabia prisão após o último recurso.

A Corte manteve esse entendimento por mais três vezes, mas a análise de mérito das ações permanece em aberto. Por isso, juízes e até ministros do STF têm decidido de forma divergente sobre essas prisões.

 

Argumentos

O sistema penal brasileiro é baseado no princípio chamado de duplo grau de jurisdição (duas instâncias julgadoras).

Para que um réu seja condenado, é preciso que um juiz de primeira instância dê uma sentença e que a decisão seja confirmada por um colegiado, por exemplo, de desembargadores, como é o caso de um tribunal de Justiça estadual.

A partir da condenação em segunda instância, o réu ainda pode recorrer em alguns casos às cortes superiores, ou seja, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal.

No STJ e no STF, contudo, provas e fatos não são reanalisados, somente questões de direito e de aplicação da lei, como eventuais contestações constitucionais.

É esse ponto que divide advogados, juristas e o próprio Supremo.

Aqueles que defendem a prisão após a segunda instância afirmam que, na prática, os tribunais superiores se transformaram em terceira e quarta instâncias da Justiça, com dezenas de recursos de réus.

Os críticos desse tipo de prisão entendem que a presunção da inocência é um direito constitucional, o que garante a todo cidadão dispor de todos os recursos possíveis para se defender, incluindo os cabíveis aos tribunais superiores. Até o último recurso, portanto, ninguém pode cumprir pena.

 

JULGAMENTOS SOBRE O TEMA

17 de fevereiro de 2016: plenário definiu em um caso específico que a pena poderia ser executada após a condenação na segunda instância e que o réu poderia recorrer, mas preso. A decisão inverteu o entendimento que vinha sendo aplicado pelo STF desde 2009, segundo o qual era preciso aguardar o julgamento de todos os recursos antes da prisão;

5 de outubro de 2016: STF julgou medidas cautelares apresentadas pelo PEN e pela OAB e decidiu confirmar a possibilidade de prisão após segunda instância;

11 de novembro de 2016: Supremo voltou a julgar o tema, no plenário virtual, e manteve a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância;

4 de abril de 2018: ao negar um habeas corpus ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Corte reafirmou a jurisprudência de que a prisão é possível após a condenação em segunda instância.

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